Aquela cativa [=escrava]
Que me tem cativo [=preso, escravizado],
Porque nela vivo
Já não quer que viva.
Eu nunca vi rosa
Em suaves molhos,
Que pera [=para] meus olhos
Fosse mais fermosa [=formosa].
Nem no campo flores,
Nem no céu estrelas
Me parecem belas
Como os meus amores.
Rosto singular,
Olhos sossegados,
Pretos e cansados,
Mas não de matar.
Uma graça viva,
Que neles lhe mora,
Pera ser senhora
De quem é cativa.
Pretos os cabelos,
Onde o povo vãoPerde opinião
Que os louros são belos.
Pretidão de Amor,
Tão doce a figura,
Que a neve lhe jura
Que trocara a cor.
Leda [=alegre] mansidão,
Que o siso acompanha;
Bem parece estranha,
Mas bárbara não.
Presença serena
Que a tormenta [=temporal] amansa;
Nela, enfim, descansa
Toda a minha pena.
Esta é a cativa [=escrava]
Que me tem cativo;
E, pois nela vivo,
É força que viva.
Luís de Camões
Luís de Camões viajou por todo o Oriente. Esteve na Índia, em Ormuz (Arábia), e em cidades que agora pertencem à Malásia, ao Vietename, à China e a Moçambique. Diz-se que teve por lá algumas namoradas. Uma delas foi Bárbara.
A Bárbara deste poema de Luís de Camões era uma escrava. Camões chamou-lhe Bárbara porque era uma mulher de um outro povo, de outra religião, que falava outra língua. Era uma mulher de pele escura e cabelos pretos. Seria do Sul da Índia? Seria africana? Não sabemos ao certo. Mas, pela descrição, ficamos com vontade de a conhecer.
A partir deste poema podemos colocar algumas questões:
- O que é ser escrava(o)?
- O que faz com que algumas pessoas sejam escravas de outras?
- Devemos aceitar a escravatura? Por quê?
- Os homens podem mandar nas mulheres? As mulheres podem mandar nos homens?
- Ainda existem escravos (pessoas compradas ou capturadas, que são obrigadas a trabalhar contra a sua vontade, que não ganham dinheiro ou que não são capazes de pagar dívidas que têm para com os seus patrões)
O poema é longo e complicado (sobretudo para os alunos mais novos); mas tem diferentes pontos de interesse que explorámos no na aula de 10 de Março:
Permitiu-nos falar sobre a passagem de Luís de Camões pelo Oriente e do contacto dos portugueses com outros povos... bárbaros
Permitiu-nos explicar o que é a escravatura e colocar alguns problemas morais: Ainda há escravatura? O que faz com que algumas pessoas sejam escravas de outras? Existe alguma razão que justifique a escravatura?
O poema foi musicado e é relativamente fácil memorizá-lo a partir da canção.
Permitiu-nos pensar sobre a língua: palavras com duplo significado; a evolução das palavras.
Mais uma vez, a poesia não foi abordada apenas pelo seu valor intrínseco, mas também pelo pretexto que nos dá para partirmos para a realidade.
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